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Foto retirada de fcporto.pt |
Demorei um pouco até escrever esta crónica. Cheguei a casa, estacionei o carro e fiquei sentado uns bons 20 segundos, a acalmar a respiração e a sorrir. A sorrir muito. Agora que estou sentado em frente ao computador, com uma chávena de chá e uma fatia de pão ao lado, vou revendo o jogo e percebendo que não havia necessidade de estar nervoso à chegada ao estádio. Era um clássico, porra, e em clássicos não há facilidades, por muito forte que a nossa equipa esteja, a outra também o é e pode-nos lixar a vida com um simples lance fortuito ou uma falha que, humanamente, acontece a qualqeur um. Hoje não foi um desses dias. Não houve falhas, não houve lances fortuitos. Houve uma equipa de azul-e-branco a demolir uma outra de vermelho, a mostrar que neste momento somos a melhor formação do país. Podemos vir a perder esta alegria de jogar, esta máquina de futebol em que se está a transformar a equipa do FC Porto, mas neste momento, neste singelo momento, somos os melhores. E ainda mais importante: provámo-lo em campo. Vamos a notas:
(+) FC Porto Todos os jogadores estão de parabéns, por um ou outro motivo. Da baliza até ao jogador mais avançado, a equipa do FC Porto hoje jogou com um entusiasmo, uma vontade férrea de ficar com os três pontos em disputa e conseguiu-o com todo o mérito. Desde a dupla de centrais, rijos e certos, passando pelos laterais, agressivos e implacáveis, continuando por Guarín, improvável esteio à frente da defesa e importante na rotação de bola, seguindo para Moutinho, esse trabalhador incansável e inteligente no passe, ou Belluschi, um misto de esforço e génio, com Varela e Hulk a romper pelas alas cheios de vigor e querer, ou Falcao, o rapaz que está no sítio certo mais vezes. Foi bonito, foi harmónico, foi futebol.
(+) Villas-Boas Quem saiu mais satisfeito deste jogo, para além dos adeptos e dos jogadores, é ele. A forma como conseguiu manter-se fiel aos princípios que advogou para a equipa, a rotação de bola constante no meio-campo, a marcação do tempo de jogo qual metrónomo, acelerando só quando é preciso e travando quando não adianta ir em correrias loucas, os lançamentos bem pensados e melhor efectuados, a troca constante de posição dos centro-campistas, a pressão constante mal a bola atravessa a linha que divide o ataque da defesa...tudo isto são conceitos de Villas-Boas que a equipa parece já ter interiorizado e que se vê em campo. Villas-Boas, para além de ter conseguido incutir estas ideias nos jogadores, conquista o público com as conferências de imprensa lúcidas, correctas, intensas, ricas, cheias de dialéctica correcta e ausentes de retórica barata. É bom treinador, o moço.
(+) Hulk Compreendo como se deve sentir David Luiz. E Fábio Coentrão. E Salvio. E Gaitán. Todos eles foram ultrapassados por Hulk em velocidades impróprias para um jogo de futebol. Hulk está em grande forma e conseguiu um feito "Capuchiano" que nem Quaresma tinha conseguido: a malta já lhe perdoa uma ou duas parvoíces por jogo. É que a produção no resto do tempo é muito, mas muito acima da média.
(+) Belluschi Já fez mais neste terço de temporada que em toda a época 2009/2010. É um jogador diferente, moralizado, empenhado, com génio no ataque e esforço na defesa. Dilacerou os rins a David Luíz e Sidnei no 2º e 3º golos respectivamente, mostrando que por vezes os bons jogadores precisam de se adaptar e de ganhar novos ritmos e rotinas. Precisam, portanto, do treinador certo.
(+) Sapunaru Já disse tão mal de Sapunaru que me tenho de penitenciar com galhos de uma qualquer árvore, desde que sejam rijos para marcar as costas. Que jogo fabuloso fez o romeno, sóbrio, simples, prático, imperial. Um herói na defesa ao corredor de David Luiz e Coentrão, Sapunaru hoje esteve perfeito.
(+) A galinha Ir ao Dragão com mais 50 mil pessoas? Entusiasmante. Estar lá a presenciar a destruição do Benfica às mãos do FC Porto com 5 secos no bucho? Utópico. Ver uma galinha a ser atirada para perto do guarda-redes do Benfica? Priceless.
(-) Jesus Se o FC Porto esteve forte porque se manteve fiel à estrutura que tem vindo a desenvolver e a implementar em campo, o Benfica foi fraco (não só mas também) por ter mudado radicalmente a sua filosofia de jogo. Qual Jesualdo em Londres ou Robson em Barcelona, Jesus mudou a equipa de uma forma que me surpreendeu, com David Luiz a defesa-esquerdo, Salvio em vez de Saviola e Sidnei no centro da defesa. As rotinas do Benfica rápido, prático e ofensivo perderam-se completamente, já que Coentrão nunca conseguiu o corredor para voar, David Luiz sem ritmo nem a garra do costume apanhou com Hulk e Belluschi com a confiança em alta, Salvio e Saviola só têm em comum uma certa semelhança no nome e Sidnei...é só fraquinho. Jesus, como se não bastasse o banho de bola que tinha levado, muito dele por culpa própria, deu uma conferência de imprensa a cuspir metaforicamente para o ar. Dizer que o FC Porto venceu porque teve um (sim, UM) jogador inspirado, é tão redutor como dizer que a Espanha venceu o Mundial porque Iniesta fez um ou dois bons passes. Jesus, que costuma ser bastante analítico e inteligente na análise aos lances, passou uma imagem de adepto ferrenho. Fica-lhe mal.
(-) Luisão Já na primeira parte, quando se pegou com Rolando, deu ar de quem estava excessivamente nervoso para um capitão de equipa num jogo destes. É inadmissível, à semelhança do que aconteceu com Bruno Alves no ano passado no Algarve, que um capitão de equipa tenha um comportamento como Luisão, agredindo um adversário que foi inteligente o suficiente para o pressionar até ao ponto de ruptura. A questão é que esse ponto não pode nem deve nunca ser atingido num jogo de tanta pressão, especialmente quando se é capitão de equipa. Cristian Rodríguez, na 5a feira, foi expulso contra o Besiktas. Hoje, Luisão, fez muito pior.
(-) O exército de polícias Quando cheguei à Alameda do Dragão, eram ainda perto das 17h, impressionei-me com a quantidade de polícias que estavam perto do estádio. Como assisti a quase todos os FC Porto vs Benfica desde 1992, já tenho alguma rodagem nestes clássicos e nunca vi nada como hoje. Um helicóptero a acompanhar em permanência o autocarro do Benfica, centenas de polícias a sair de dezenas de carrinhas e autocarros do corpo de intervenção, quase todas as passagens barradas e um ambiente de imponência a parecer uma zona de guerra em rescaldo. Tanta fachada...e não conseguiram evitar que dois ou três retardados atirassem bolas de golfe ou pedras ou sei lá o que raio atiraram ao autocarro do Benfica e partissem alguns vidros. Ah, e quem paga isto tudo? Pois, os mesmos que se queixam da crise. Carrega, lusitano.
Cheguei a casa rouco. Não me lembro de gritar muito durante o jogo, mas a minha garganta lembra-se. Este foi daqueles jogos que vai ficar na memória de tanta gente durante muito tempo. Ganhámos 5-0 ao Benfica. No Dragão. Com 50 mil almas a saltar, a exultar, a vibrar com um FC Porto demolidor, com jogadores cheios de confiança, seguros do que faziam e com uma garra, sentido de sacrifício e vontade de vencer como raramente se vê. Hoje, com a força toda que consegui reunir, gritei. Não me lembro. Só me recordo dos golos, da festa e da alegria de vencer um grande jogo a uma grande equipa que hoje não o foi. Por nossa culpa.
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